(deposito proviniente de inglaterra)
Certamente
já conhece o fenómeno das deposições da idade do bronze, um deposito é um ou
mais objetos intencionalmente escondidos num local, é um fenómeno que acompanha
a humanidade desde o neolítico, mas que tomou dimensões muito desproporcionais
no final da idade do bronze, e tão depressa quanto este fenómeno se tornou tão
frequenta, acabou abruptamente na idade do ferro Deposito de ''maria candal''
A
interpretação inicial dos depósitos é que seriam esconderijos, sítios onde as
populações escondiam as suas ferramentas ou joias, até porque, se o leitor se
imaginar a viver na idade do bronze, onde mais esconderia algo se não debaixo
da terra, ou entre algumas rochas ? Parece ser uma explicação logica mas não
explica o motivo das proporções deste fenómeno, será que as populações do
bronze final sofriam de um terrível caso de amnesia coletiva e esqueciam-se
onde tinham enterrado os seus metais? Metais esses tão valiosos naquela época. A
interpretação ignora também os depósitos feitos em contextos irrecuperáveis
como as deposições em meio aquático, ou em fendas profundas na rocha. Não colocando
fora de hipótese que um ou outro depósitos sejam efetivamente esconderijos, de indivíduos
ou mercadores, até mesmo depósitos de fundidor, mas simplesmente pela dimensão
do fenómeno não podemos aceitar esta interpretação
Deposito de paredes de coura (machados ainda com cone de fundição)
Começamos também
a notar vários padrões curiosos nos depósitos, por exemplo, é muito raro, ou até
mesmo inexistente, surgirem materiais de origem mediterrânica em contexto de depósitos,
por exemplo fíbulas, é também comum encontrar ferramentas, nomeadamente
machados, que nunca foram usados, alguns nunca foram sequer preparados para ser
usados, encontram-se machados ainda com o cone de fundição, isto significa que
aquelas peças foram feitas especificamente para ser enterradas
há também a
interpretação que sugere que os depósitos seriam uma tentativa de manipulação
de mercado, o período onde os depósitos são mais vulgares é precisamente o
bronze final, período em que começam a aparecer peças em ferro, muito
superiores ás peças em bronze, alguns arqueólogos sugerem então que o motivo
por trás do enterro de peças em bronze seria para tornar o bronze mais raro, o
bronze é um metal reciclável, uma vez que uma ferramenta se parta, pode sempre
ser derretida e fazer-se outra, o bronze ocupava um lugar muito importante na
sociedade e nas economias, a chegada do ferro, que pode ser obtido praticamente
em todo o lado, e é mais eficaz que o bronze, poderia ameaçar uma suposta elite
que baseou a sua riqueza no comercio do bronze, logo os depósitos seriam uma
tentativa de remover bronze do mercado e aumentar o seu valor, esta teoria pode
parecer bastante apelativa, porém apenas de um ponto de vista moderno, não
podemos assumir que os povos antigos tinham as mesmas ideias económicas que
nos, alias, durante a idade do bronze em Portugal nem existia ‘’dinheiro’’, é
um período em que a economia baseia-se essencialmente em trocas de bens, porém
mesmo assumindo que os homens da idade do bronze estariam intencionalmente a
manipular o mercado, surge outro pormenor que nos leva a pensar em outras
perspetivas, dentro de toda a variedade de objetos nos depósitos, há um fator
em comum, todos estes objetos são de origem indígena, produzidos localmente e
seguindo a tradição local, porem ao escavar povoados sabemos que estes povos
tinham uma quantidade significante de objetos importados, não são as fíbulas de
bronze na mesma? Porque não juntar as fíbulas aos depósitos? Talvez o leitor
tenha lido sobre alguns ‘’depósitos’’ como o de porto do concelho onde surgiram
fíbulas, é importante notar que este ‘’deposito’’ consiste num pequeno deposito
e de outras peças encontradas noutros contextos mas no mesmo local, em depósitos
propriamente ditos não se verifica a presença de fíbulas, as fíbulas poderiam
ate ter vindo a ser produzidas localmente, mas surgiram em Portugal devido a
influencias mediterrânicas, como explicamos este ultimo pormenor?
Deposito de coles de samuel
dado este
fator podemos assumir que os depósitos são atos tradicionais das comunidades indígenas,
mas qual seria a sua função? Claro que tendo tudo em conta parece que a
explicação mais adequada é que estes depósitos seriam algo ritual, esta
interpretação é apoiada pelo facto de muitos destes depósitos serem encontrados
em sítios com algum destaque na paisagem, nascentes de rios, formações rochosas
fora do comum, cavernas e fragas, lagos e pântanos, outros locais que á
primeira vista não aparentam ter nenhum destaque na paisagem poderiam outrora
ter outro significado, por exemplo uma arvore enorme, ou o local onde caiu um
raio, ou onde pairou uma ave, não sabemos, mas efetivamente uma significante
parte dos depósitos são achados em locais com um expressivo destaque, talvez se
possa interpretar as deposições como oferendas a uma entidade, ou talvez como
um sacrifício, ou até uma devolução á terra do bronze que esta lhes
providenciou, geralmente na arqueologia interpretar algo como um ritual ou algo
relacionado com misticismo é mal visto, é na verdade dito que quando um
arqueólogo não sabe o que é algo afirma ser ritual, no entanto efetivamente
parece que o fenómeno das deposições seria algo ritual ou votivo, tendo em
conta que nenhuma outra interpretação consegue responder a todo o fenómeno das
deposições
''Portas de Alvaiazere'' local onde foi encontrado um deposito
é provavelmente
a explicação mais certa apesar da arqueologia atual tipicamente considerar ‘’preguiçoso’’
interpretar algo como ritual, este fenómeno é mais um que contribui para a
extensa lista de mistérios acerca do bronze final, parece que quanto mais
escavamos e estudamos os povos indígenas, menos realmente sabemos, cada
descoberta faz-nos ter mais questões ás quais não conseguimos responder, e não sabendo
responder, dizemos que é ritual